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Observatório Automotivo: em maré alta de juro, SUV nada de braçadas

Vendas andam de lado diante de carros e financiamentos muito caros

Jeep Renegade Willys 10 anos (BR)
Foto de: Jeep

Até que demorou para o juro alto começar a sabotar o crescimento do mercado de veículos no País, mas segundo apontam os mais recentes números as vendas estão andando de lado, dão seus primeiros sinais de retração após um primeiro quadrimestre razoável. A queda, contudo, atinge especialmente os carros mais baratos, pois os SUVs seguem nadando de braçadas na maré alta dos juros. 

Com poucas opções que começam na faixa de R$ 100 mil a R$ 120 mil e muitos modelos que am dos R$ 150 mil e chegam facilmente aos R$ 200 mil, os SUVs dominam o mercado brasileiro e seguem crescendo porque têm clientes que podem comprá-los, apesar do alto custo dos financiamentos.

Galeria: Novo VW Tera - fotos oficiais (BR)

No primeiro quadrimestre deste ano as vendas de veículos leves cresceram apenas 3,4% em comparação com o mesmo período de 2024 – e se tirar os utilitários da conta e considerar apenas os automóveis o avanço é ainda mais tímido, de 2%. 

Quase toda a tímida expansão do mercado de veículos leves foi puxada por produtos importados, com alta de quase 19% nos primeiros quatro meses do ano, enquanto o desempenho dos modelos nacionais foi de 0%. Não por acaso a maior alta do período, de 28%, foi dos carros importados da China, elétricos e híbridos que em geral custam acima dos R$ 150 mil. 

Ou seja: tem mais gente competindo em um mercado que não sai do lugar e está sendo ocupado por produtos de valor relativo alto para os padrões de renda nacional, o que desfavorece o tão almejado aumento da motorização do País.

Galeria: Volkswagen T-Cross Extreme (Brasil)


Só dá SUV

O movimento pendular do mercado para os produtos mais caros fica mais evidente quando se olha para o desempenho dos diversos segmentos. E aí só dá SUV – incluindo principalmente os inventivos modelos nacionais que mais se parecem com hatches compactos anabolizados, projetados para países subdesenvolvidos, caracterizados por sofisticação e capricho nos acabamentos muito abaixo do preço que cobram.

No cenário em que só os mais abastados conseguem comprar um carro zero-quilômetro atualmente, os SUVs, mesmo cobrando muito pelo que oferecem, ampliaram ainda mais seu domínio. 

Segundo dados do Renavam consolidados pela Fenabrave, de janeiro a abril foram emplacados no País 296,9 mil SUVs de todas as marcas e de todos os tamanhos, o que representou alta de 16,4% sobre igual intervalo de 2024, 13 pontos porcentuais acima da média do mercado e ampliando em 7 pontos, de 47% para 54%, a participação destes modelos nas vendas totais de automóveis no período. 

Com este resultado o segmento de SUVs foi o único que cresceu muito acima da média do mercado no primeiro quadrimestre. Dos vinte veículos mais vendidos do Brasil neste período nove são SUVs, número que sobe para doze quando se consideram somente os automóveis, sem colocar na conta os modelos comerciais leves, essencialmente as picapes.

E não são os SUVs mais baratos os mais vendidos: o primeiro da lista – e quarto na classificação geral – é o Volkswagen T-Cross, que começa em R$ 120 mil [para PCDs] e chega a R$ 189 mil no topo da linha. O segundo SUV mais vendido do período foi o Hyundai Creta, seguido por Honda HR-V e Toyota Corolla Cross, todos na mesma faixa de valores e na lista dos dez veículos mais emplacados do País de janeiro a abril.


Hatches e sedãs afundam

As outras duas maiores categorias do mercado brasileiro, hatches e sedãs compactos, anotaram quedas nas vendas no acumulado de quatro meses de 16% e de 8%, respectivamente.

Os hatchbacks estão na categoria que mais perdeu participação, 6,5 pontos, de 37% para 30,5%, e os sedãs compactos cederam 1 ponto, de 11% para 10%. 

O desempenho dos dois carros mais baratos do País nos meses iniciais de 2025 demonstra que o público preferencial deles perdeu o poder de comprá-los. No acumulado de janeiro a abril o Fiat Mobi foi apenas o sétimo veículo leve mais vendido do País, perdendo para opções mais caras e até para o muito mais caro VW T-Cross, enquanto o Renault Kwid ficou na décima-sexta posição no quadrimestre, atrás até da Fiat Toro. 

Fiat Toro Volcano 2025

Fiat Toro Volcano 2025

Foto de: Divulgação


Picapes também avançam

As picapes formam a outra única categoria cujas vendas também avançaram no período, mas bem menos do que os SUVs. Os emplacamentos de modelos pequenos, médios e grandes somados cresceram 5,8% de janeiro a abril na comparação com o mesmo período do ano ado. 

Picapes são veículos de uso misto comercial-particular que, muitas vezes e dependendo do modelo, ocupam o mesmo espaço de um SUV nos desejos dos consumidores e também trafegam na faixa de preços acima dos R$ 100 mil no caso de modelos compactos e picapes médias am dos R$ 300 mil.


Crédito caro e mais curto

O custo do crédito favorece a imobilidade social do mercado nacional de veículos, pois os financiamentos com prestações que cabem no bolso sempre foram o principal fator de diluição de preços que impulsiona as vendas de carros novos, principalmente os mais baratos que am a ser íveis à população de menor renda.

Por isto a alta dos juros, elevados aos patamares mais elevados desde o início deste século, sabota as chances de crescimento na base do mercado.

Dados do Banco Central já demonstram a retração do crédito. No primeiro trimestre deste ano – o dado mais recente disponível – as concessões de novos financiamentos para compra de veículos soma R$ 48 bilhões, valor 15,7% menor do que o registrado nos primeiros três meses de 2024. 

O juro médio cobrado para compra de veículos, em março ado, alcançou o recorde histórico de 28,6% ao ano, 1,1 ponto porcentual acima do verificado no primeiro trimestre do ano ado, acumulando alta de 3,2 pontos no decorrer de doze meses. Lembrando que esta é uma média, o que significa que há taxas menores e maiores no mercado. 

A inadimplência de 4,7%, medida em março, ainda seguia comportada, mas com tendência de alta, subiu 0,5 ponto em relação ao primeiro trimestre de 2024. 


Expectativas para baixo

Apesar do cenário de crédito adverso as vendas totais de veículos cresceram 5% no acumulado de janeiro até o fim da primeira quinzena de maio, mas o desempenho parece efêmero, pois maio do ano ado foi severamente afetado pelas enchentes do Rio Grande do Sul, o que prejudicou não só os emplacamentos no Estado mas também a produção de fabricantes de todo o País por causa da falta de peças que vinham de fornecedores alagados e paralisados no Sul. 

As duas principais entidades representativas do setor, Anfavea e Fenabrave, ainda sustentam as projeções feitas no início de 2025, de crescimento moderado da vendas de veículos este ano na casa dos 5%. Contudo alguns fabricantes já item que estão revisando para baixo suas expectativas.

No varejo muitos concessionárias relatam queda no fluxo de clientes nas lojas e maior resistência dos clientes em fechar negócios, enquanto no atacado as locadoras, segundo a Abla, devem reduzir as compras para cerca de 600 mil a 620 mil, número inferior aos 650 mil do ano ado. 

Mas uma previsão parece certa: se houver crescimento ele será, mais uma vez, somente no andar de cima do mercado.

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